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                   Foto:  da Prefeitura de Pirapora.   
                   
                    PIRAPORA - MINAS GERAIS - ESTRADA E SOLIDARIEDADE 
                  12-01-1994 
                    
                  Na  estrada, mais uma vez. Sozinho. No LADA NIVA 1600, uma carroça russa — misto de  tanque com sauna dinamarquesa. Mas dá a sensação de segurança, como no  Encouraçado Potenkin.  
                    Há tempos queria fazer uma viagem de férias. Sem planos. Apenas uma ideia na  cabeça. Na direção do Rio de Janeiro. 
                  O  trecho inicial, nos cerrados goianos e mineiros, é uma monotonia só. Mas nesta  época do ano, para animar, está verde, com as chuvas. 
                    A primeira parada foi em Cristalina (GO) para uma visita às casas de lapidação.  São muitas, oferecendo quase sempre as mesmas coisas: bijuterias, objetos de  decoração, cinzeiros, ovos de pedras, pirâmides ornamentais, tampos de mesa,  tabuleiros e peças de xadrez e jogos de dama, algumas bonitas, outras de mal  gosto. Ideal para comprar lembranças e presentes. 
   
                    Voltei a comprar garrafas de aguardente, pela originalidade dos rótulos. Já  tive uma coleção grande de cachaças, trazidas das mais distantes regiões do  país, logo consumidas, às escondidas, pelos caseiros pinguços que serviam na  chácara, ou trabalharam em pequenas obras... Sobraram poucas, de tantas que eu  colecionei. [Eu não bebo. Meu pai morreu por consumi-las...] 
                    Sobraram poucas, de tantas que eu colecionei. 
                    Dizem que o Zé Adriano, nos delírios de sua dependência alcoólica, extraía a  pinga com seringa e depois recheiava com água... O filho Jerry, que morou na  minha casa da chácara, também tinha inclinações para os secos e molhados e  teria bebido a sua quota clandestina, para não falar de outros caseiros  aficionados... 
   
                    Fiz o que não se recomenda fazer na estrada: dar carona para desconhecido. O  rapaz era humilde, com uma cara bonachã e carregava as compras que fizera no  supermercado de Cristalina. Ia para os arredores de Paracatu. Paraibano.  Trabalha numa grande plantação de urucum  [Bixa ordana L.] para a produção de condimentos e tintas. Acabei visitando a  fazenda onde ele mora e conheci a família dele, tomei água do filtro,  ofereceu-me uma enorme sacola de imensas mangas-rosa. Luis, uma simpatia.  
                    Visitei, outra vez, Paracatu, que continua crescendo muito. De colonial só  restam alguns traços urbanos e a velha igreja. 
   
                    De novo, dei carona para um rapazinho até João Pinheiro. Fez mil perguntas  sobre o carro — novidade para ele, um automóvel russo —, e sobre a minha vida.  Queria saber se eu já andei de avião. Desinibido, o garoto. 
                    Cinco horas depois da saída de Brasília, eu estava no entroncamento par  Pirapora, nos Posto JK. Um homem aflito quase jogou-se debaixo do carro,  pedindo ajuda.  Vinha do hospital, onde  deixara o irmão acidentado. Voltava para ver a carreta em que viajavam. Estava  a dez quilômetros mais adiante, virada, com a carga jogada na estrada.  Um desastre terrível!  
                    A carreta derrapara numa curva, tentando escapar de uns buracos. O chofer foi  projetado para fora, quebrando o parabrisa.   Estava sem cinto de segurança. Ficou bastante machucado. 
                    O sulista a meu lado, salvou-se de milagre. Desceu do jipe e ficou lá diante da  carreta. Outros caminhões lá estavam parados, dando apoio.  
                      
                  A  estrada para Pirapora/Montes Claros está em reforma. 
                    O tráfego de caminhões é intenso, na  direção da Rio-Bahia. É muito chão pela frente. E muitos perigos. 
                    Pirapora é famosa, não apenas pele célebre canção de Renato Teixeira, conhecida  nacionalmente na versão de Elis Regina, mas também pelas corredeiras do Rio São  Francisco, e principalmente pelas pitorescas “gaiolas” (vapores) que descem e  sobem o rio preguiçosamente. Desciam, pois hoje apenas um vapor faz trajetos  esporádicos, mais para os turistas. 
                    Pirapora é também famosa pelo seu animadíssimo carnaval.  
   
                  Acabei dando carona para um negro gordo e simpático, a pedido dos operários da  empreiteira que asfaltava a estrada. Passou uma hora completa dando-me  informações sobre a cidade, suas cheias periódicas — o rio inunda tudo, como em  1979 —, as secas prolongadas, e o tema de sua predileção: as escolas de samba e  os blocos carnavalescos. 
                
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